quinta-feira, junho 30

Não há machado que corte...

"When we don't speak, said Edgar, we become unbearable, and when we do, we make fools of ourselves."


Não sei se era da Ana andar a ler e reler o livro da Herta Muller e sempre a citar frases do livro, mas a verdade é que aqui na gaiola as coisas estavam cada vez mais parecidas com a Roménia de Ciao.

Cada um de nós até parece que assumia uma das personagens do livro de forma natural.

Por exemplo, as refeições pareciam verdadeiras sessões de interrogatório do Capitão Pjele, só que com o Major Pernas, enquanto que o Júnior era com certeza um dos rapazes do livro, talvez o Edgar, afinal quero que o miúdo sobreviva.

Eu pelo sim pelo não imagino-me o Georg só que mais bem sucedido, sou passáro mesmo dos que voam....


A avó é obviamente a Avó que canta não porque ela cante mesmo mas porque nos consegue enlouquecer a todos com os seus raciocínios (i)lógicos, especialmente quando discorre sobre os seus conhecimentos sobre pássaros, mas isso terá que ficar para outra altura.


Não faço o resto da distribuição do elenco, vocês que leiam a história e pensem...


O Pernas é autoritário e quer que os miúdos se sentem direitos, comam com os cotovelos junto ao corpo sem estarem apoiados na mesa e de boca fechada. Tudo tem que estar alinhado e perfeito , desde as fatias de pão cortadas da forma correcta ao queijo fatiado sem mácula. Mas é muito mais rígido com o Júnior do que com a Boneca.


O Júnior passa a vida a reclamar que a Boneca tem os cotovelos em cima da mesa, que a mamã não está direita ou que a avó está a falar alto. O Pernas ordena ao Júnior que se cale e já saturado diz-lhe que pare de pensar no que os outros estão a fazer ou não.

- Para de pensar nos que os outros estão a fazer ou não!, grita o Pernas zangado, e pensa apenas em ti e no que estás fazer!


É então que o Júnior para de reclamar e diz com a calma e a clareza dos justos, não esquecendo o sorriso cândido de quem sabe que acabou de dizer o óbvio:

- Desculpa papá mas isso é uma parte da minha vida em que tu não mandas: os meus pensamentos. Eu penso naquilo que eu quiser!


(Não há machado que corte a raiz ao pensamento.)

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